SE ME PERMITEM...
Por Francisco Guil
Imagino como você se sente quando se fala de direita/esquerda. Causa desconforto. A mim, que sou declaradamente de esquerda, não causa, porque sei que este é um fenômeno necessário-transitório. Mas incomoda os da direita. É bem visível que ao longo das décadas você pendeu para a direita e que cancelou em sua mente todo e qualquer olhar para os ideais da esquerda.
Como isso acontece com uma pessoa, é algo que ainda estou tentando compreender. Em nossa família vi somente um processo inverso, que deu-se com a June. Lembro nitidamente do dia em que ela me disse que detestava o Lula. Perguntei por que, ela não soube me dizer. Mas com o passar dos anos suas filhas parecem ter semeado em sua cabeça algumas sementes de pimenta vermelha, e ela mudou radicalmente.
Mas vamos aos fatos, ao menos os fatos como eu os vejo: A direita nunca gostou da divisão teórica "direita-esquerda" porque este é justamente um instrumento de exposição de uma realidade, da qual a direita usufrui, mas não quer que seja exposta. Eu também preferiria que não houvesse esquerda/direita, essa divisão é ridícula. Mas existe na prática, e não é à esquerda que a promove. É à direita! É uma "classe" que se põe no mundo dona de privilégios (e sabe-se que, quando alguém tem privilégios, outro alguém sempre está perdendo alguma coisa) e que deles não abre mão, senão à força.
À força dos movimentos sociais, por exemplo. À força de um governo que promove o "empoderamento" de pessoas que passaram séculos e milênios subjugadas, como é o caso das mulheres, dos gays, dos afros, dos operários não escolarizados. Eis o porquê do ódio ao Lula. Porque ele acelerou o processo de aproximação das classes sócio-econômicas, e os que estavam alguns degraus acima odiaram isso.
Querem matar o Lula por causa disso, não por causa de supostas corrupções. A burguesia brasileira nunca fez e nunca fará nenhum esforço para construir uma ponte que a conecte com a classe que considera subalterna. No máximo fará alguns chás beneficentes e coleta de cobertores para curar sua dor social. Mas não quer proximidade com os de baixo, absolutamente.
Aqui no Oeste do Paraná está nítida a evolução das cidades, que por serem jovens permitem perceber como grupos de pessoas de mesma classe foram se distanciando, até que o contato tornou-se impossível. De repente os velhos amigos já não podem se ver nos clubes e jogar baralho, porque um foi para o clube dos ricos, o outro permanece no clube velho e pobre.
A esquerda continuará sendo esquerda até que, com a força de sua inteligência, e não mais das armas, consiga fazer equilibrar a injusta balança social. Não se trata de comunismo nos moldes soviéticos, como diz o pessoal. Trata-se de justiça, simplesmente.