QUESTÃO DE HONRA
Por Renato Uchôa (Educador)
Por Ana Paula Romão (Educadora)
Gonzaga da Cacimba, morador da cidade de Princesa na Paraíba, agiu baseado no Código de Honra do Nordeste, em 1979. Que salteia, faz ainda morada no coração e na mente de milhões de nordestinos e brasileiros. Gonzaga matou sete pessoas de uma mesma família, tornando-se o Mata Sete de Princesa. Daí a origem do nome, batizado pela imprensa. Gonzaga, pelos relatos de quem conviveu com ele foi um homem bom, pacato até na pisada.
Cobria o corpo com um terno branco e batia pernas nos cumprimentos às pessoas, e compra de doces para as crianças. No ponto principal das cidades pequenas do interior: a feira do mercado. É lá que se encontra ainda hoje a tapioca, a macaxeira, o arrumadinho de charque, o inhame, o porco assado, a buchada de bode, o sarapatel, a carne de sol, o cuscuz de milho ou de arroz, dependendo da região, com o perfume da manteiga da terra (manteiga de nata). É lá que no período imperial a revolta popular conhecida como o Ronco das Abelhas fez morada. Um movimento de revolta (aconteceram dezenas) que se alastrou, principalmente no Nordeste, nas feiras, nos mercados o povo reagiu contra o poder imperial, nos idos de 1851 e 1852. Com destaque para Pernambuco e Paraíba... Vai com a graxa ou sem? Capricha Dona Paixão.
Luiz Gonzaga Pereira dos Santos acolheu de corpo e alma no Sítio Caldeirão Fernando Alves de Almeida, já com 23 anos no espinhaço. Batizado e criando para não cometer crimes. Educação que não tem endereço na escola da Elite, mas, dança na sala, cozinha, terraço e quintal, nos tempos bons ou ruins.No seio das camadas subalternas. Herdada dos ancestrais na formação do caráter, na solidariedade, na convivência de respeito a si e a os outros. Não roubar o que é do povo, como Temer, Cunha, todas as cunhas nos bolsos do PSDB, PMDB, DEM.... Milhares delas desde que Cabral pisou na Terra Santa, para cravar na moleira dos índios, mulheres, negros...
Fernando se apaixonou por Vera Lúcia, com 12 anos, romance secreto que motivou posteriormente a tragédia. Fernando farejou o perfume da morte quando “mexeu” com Vera. Selou o cavalo, com ajuda dos pais e Seu Gonzaga da Cacimba, no pinote em direção a São Paulo. Deu o bote certeiro no pensamento... Passou a perna em Vera, no Ganga Pé, trincou a honra do Seu Gonzaga, como se diz aqui no Nordeste. Quando não voltou para casar. Três anos de angústia, de espera. Não veio cumprir a promessa sagrada da palavra empenhada, sem registro no cartório. Tirou o passaporte para o Céu ou o Inferno. Quando as notícias com fotos do casório, com outra em São Paulo causaram uma tempestade de ódio.
Baldeando, azucrinando, espeziando com a desfeita o juízo de Gonzaga da Cacimba, no pio de plantão dos fuxiqueiros/as costumeiros das esquinas e janelas da cidade. Nas Universidades, em todas as repartições públicas ou privadas, os especialistas em fuxico se batem nos corredores. Gonzaga da Cacimba, tem pessoas que juram de pés juntos, foi a São Paulo várias vezes para cobrar a conta e pagar o caixão de Fernando, e oferecer a mortalha de presente. Nunca o encontrou.
Gonzaga da Cacimba decide matar a família de Fernando. Cobrar a promissória da família, vingar para lavar a honra, baseado no Código de Honra que mutila, mata milhares de mulheres no Brasil de dentro a fora, pela cultura da posse. Em 29 de junho de 1979, dia de São Pedro. As fogueiras enfeitam as ruas, o milho aguarda o sapecado, o aluar, a canjica se enfeitam para a festa em homenagem ao Santo. Gonzaga da Cacimba ajeita o candeeiro, quando a Lua prateada, no lugar do Sol, anuncia, lança no mundo a cor da sua beleza. Engoma o revólver, e decidido ruma em direção à casa da família de Fernando,o autor da desonra.
Mata na mesa do jantar, na hora sagrada, José Alves de Almeida e mais 6 pessoas. A esposa e os cinco filhos. Antes do ato cruel, hediondo, indefensável, ordena que uma prima de Fernando por nome de Maria do Socorro Alves se retire do local. Gonzaga da Cacimba se transforma no Mata Sete de Princesa, e 24h por dia a imprensa nos assusta, causa pavor e medo do sertão à capital João Pessoa. Mostra os sete mortos vestidos com os caixões, transforma o dia de São Pedro no carnaval macabro que a mídia faz com qualquer um na busca de audiência. Um crime de repercussão nacional.
Após três anos fugindo, o grande final. Em março de 1981 o cerco policial é feito. Gonzaga da Cacimba não se entrega, e nos últimos momentos da vida nos ensina, não com o assassinato cruel da família, mas na afirmação, morro como homem, como um ser humano que não é um bandido. Gonzaga se recusou a morrer apodrecendo em um presídio, exposto nas vitrines da morte que caracterizam a situação dos apenados. Enfrentou a polícia à bala, o maior tiroteio localizado que já houve por lá. Reage e é fuzilado. O barulho dos tiros, há quem diga, acordou a Princesa Isabel na cova, que homenageia a cidade com a graça.
Todos os povos do mundo têm seus códigos, que em situações de ameaça aos direitos, as garantias, a liberdade, reagem dentro ou fora da Lei, que não mais os protegem. E escrevem a nova Constituição no asfalto da luta, nas ruas e avenidas. Os ladrões do mandato da presidenta Dilma têm os seus, e têm também seus dias contados. Roubar a democracia e instalar o Estado de Terror, que marcará por gerações o futuro do país, justifica a posição de insurgência da população contra todos os atos ilegais que caracterizam o Usurpador Temer.
Os trabalhadores/as brasileiros/as, diante do Golpe, que não precisou de mais de um ano para fatiar a nação, entregando as riquezas. Que assaltou a luz do dia o mandato que não é apenas de Dilma, mais de 54 milhões de brasileiros/as, por uma questão moral, é o nosso Código de Honra, devem fazer o cerco em Brasília dia 24 de maio e cobrar de volta a Devolução da condução dos destinos do país, a quem de direito. Se o STF, na voz da presidenta Carmén Lúcia, que nos afronta com a afirmação recente que as Instituições trabalham “normalmente”...Mas, para consolidar o Golpe dentro do Golpe. O Congresso Nacional, as outras Instituições parceiras do Golpe, que teimam em não restabelecer a Democracia, mesmo diante das provas do crime praticado pelas verdadeiras gangues, que a gente tome em nossas mãos o nosso destino, o destino do país.
Para além de todas as lutas importantes pelas Diretas, a anulação do Golpe, com a devolução do mandato a nós e a presidenta Dilma, é que nos encaminhará para a convocação das Eleições Diretas. Por quem tem autoridade legítima e moral para realizá-las, com o reestabelecimento do Estado de Direitos. A contaminação generalizada dos Aparelhos Repressivos do Estado em favor do Golpe, como garantia só a desarticulação completa deles, com manifestações de repúdio aos traidores do Brasil, em todo o país, permitirá o clima saudável do processo eleitoral.
Que as abelhas, no ronco em 24 de maio próximo, instale concretamente em Brasília, o início da derrocada do Estado de Terror. Sem negociação.
Dedicado a Gláucia Magalhães (neta) de Gonzaga da Cacimba, e família, E a família dos mortos.