QUEM FOI LUCIANA DE ABREU?
Por Carla Kunze
Não há o que comemorar hoje. Há apenas do que reclamar. A crise provocada pelos golpistas está atingindo principalmente as mulheres. Seja porque elas hoje são as provedoras das suas famílias e o desemprego as atingiu muito mais do que aos homens (basta ver os números divulgados na imprensa), seja porque, além de tudo, nossos governantes estão fechando escolas, deixando desamparadas as mães, as professoras (já tão sofridas por trabalharem sem receber), e isso se torna uma bola de neve.
Às vezes, penso que isso que está acontecendo se equipara a um pós-guerra, quando as trabalhadoras perderam seus postos de trabalho para os homens, que haviam se cansado de brincar de lutinha. Minha homenagem hoje vai às mulheres que certamente serão prejudicadas com o já anunciado fechamento da escola Luciana de Abreu.
Aquela escola me acolheu num dos momentos mais difíceis da vida, quando eu tinha apenas 8 anos de idade, em 1973, e minha irmã sofreu um acidente, quebrou a coluna e ficou paraplégica. Tive de sair de minha casa e de minha escola e ir morar na casa da minha tia e aí me matricularam no "Luciana", 3ª série do primário, em plena ditadura militar.
Ali, fui acolhida com carinho, passei bons momentos, participei do orfeão! Ninguém adivinha o que é ter 8 anos e perder tudo de repente, mas aquelas mulheres do Luciana sabiam como fazer a vida ter um pouco de alegria em meio a tanta tragédia. Fico muito triste em ver este governador inescrupuloso construindo presídios e fechando escolas. Encerrando histórias lindas e já programando um novo lugar para as hoje crianças desamparadas que futuramente serão adultos desempregados, incultos, traumatizados e marginalizados - a cadeia.
Fechar o Luciana, mais que tudo, é encerrar ali uma linda homenagem à grande Luciana de Abreu, uma menina abandona ainda bebê na roda dos expostos da Santa Casa de Porto Alegre e que mais tarde se transformou numa poetisa, escritora, professora e militante feminista. Viveu tão pouco (morreu aos 33 anos de tuberculose), ainda assim, deixou um legado de lutas pela educação e pela mulher, foi a primeira mulher a participar de uma sociedade literária e a primeira a ter voz numa tribuna para falar sobre emancipação da mulher.
Isso tudo na década de 1860. Sim, eu disse 1860. Neste 8 de março, só quero uma coisa: que a sororidade, essa palavra linda e tão nova nas mentes, vá além de "fraternidade entre as mulheres" e se ressignifique, que essa palavra seja usada para defender a educação pública, para unir as mulheres contra o fechamento do Luciana e de outra dezena de escolas que Sartori já anunciou que vai fechar a partir deste ano. Sororidade contra Sartori e pelo bem de todas as mulheres, famílias, educadoras, comunidades. E um viva especial à Luciana de Abreu!