CHIQUEIROS URBANOS
Por Francisco Guil
No decorrer de quinze anos mudei de endereço treze vezes, em quatro cidades, entre Curitiba e Guarapuava. E o que encontrei nas casas alugadas teve poucas variantes.
Mudar de casa uma vez por ano tem suas vantagens. Conhecemos novas pessoas, novos ambientes, enfrentamos novos desafios e crescemos a partir de suas resoluções. Deparamos inevitavelmente com diferentes formas de interpretar e entender o mundo. E, melhor que tudo, saímos da roda de fofocas que se instala sempre que ficamos muito tempo num só lugar.
Mas também há alguns inconvenientes. A maioria das casas de aluguel apresenta problemas, os mais diversos e estranhos. A começar pelos quintais e jardins. Isso quando há jardim, e não um chão de terra vermelha para sujar a calçada e a casa sempre quando chove. Se quiser criar um ambiente agradável, você pode contratar um jardineiro. Mas se pretende deixar o jardim do jeito que você gosta, terá que pegar na enxada e no rastelo e fazer você mesmo.
Mas nas casas urbanas o solo raramente é dos melhores, porque foi passado a patrola para nivelar e plantar os alicerces da edificação, e também porque o chão tem mais areia e pedras do que húmus. Os construtores, ou os reformadores da residência, deixaram montes de cimento e cal por todo lado. Fizeram novos muros e calçadas, instalaram postes para estender arames, construíram casinhas infantis. Pedaços de lajotas, ladrilhos e crostas de cimento estão por toda parte. Os antigos moradores também deixaram restos de sacolas, hastes de cotonetes, tampas de garrafa, arruelas, porcas, parafusos, invólucros de preservativos e sonrisal, garfos, isqueiros, saca-rolhas, facas, vasilhames, cacos de vidro e cerâmica, restos de brinquedo, bolinhas de gude, tudo misturado com a terra.
Imagine a dificuldade das plantas para crescer nesses ambientes. Até mesmo a tiririca, que tem raiz profunda, mostra dificuldade em sorver a seiva da terra nesses lugares. Os objetos artificiais impermeabilizam a terra, as raízes têm grande dificuldade para se alastrar. Para cultivar flores ou grama, ou mesmo hortaliças e limoeiros, abóboras e melancias, é necessário retirar essa sujeira, jogar terra nova e reavivar o solo.
Por que as pessoas são tão porcas — com o perdão das porcas, que se lambuzam no banhado, mas nunca foram flagradas jogando bituca de cigarro e frasco de shampoo pela janela? Enfim, por que as pessoas são tão porcas? Por que se acham no direito de plantar todas essas porcarias, onde quer que estejam, na rua, na praça e em seus próprios quintais?
Não é difícil entender que as pessoas sujem as ruas e as praças, afinal, esses são locais públicos. Os cidadãos gostam de pensar que pagam impostos e que, com isso, garantem o salário dos garis. Sacolas, garrafas e coisas igualmente vistosas ilustram todas as calçadas e outros ambientes públicos de todas as cidades brasileiras. Parece que não há garis bastantes para garantir a limpeza e a higiene das cidades. E quando deparamos com esses jardins e quintais, que são habitados por pessoas, e neles encontramos a mesma nojeira das ruas e praças, que podemos pensar deste gênero animal, deste ser incapaz de preservar limpo e asseado o próprio ambiente em que reside?
Esse animal estúpido que somos deve ser denunciado um milhão de vezes, e ser penalizado por seus crimes ambientais. Não percebemos que está em nossas atitudes a preservação do paraíso. Preferimos ir ao templo, regatear com Deus — à base de muitas orações e doações — um paraíso no extra-mundo, onde tudo estará novamente limpo e lindo. Para que possamos novamente despejar, nesse paraíso etéreo, toda a sujeira e a nojeira da infeliz condição humana.