O encontro marcado, o início do fim
Por Gabriela Souto
Eis a origem de todo o ódio que irrompe no Brasil nos últimos tempos, inspirada em leituras de Darcy Ribeiro e Marilena Chauí. Faz pouco mais de uma década, não havia Brasil. Essa é a verdade: o que havia era um prolongamento histórico do Modelo Colonial Açucareiro, Casa-Grande e Senzala - infamemente chamado de país. No qual se via, de um lado, uma minoria rica usufruindo confortavelmente da força de trabalho de uma maioria pobre, de outro, e, no meio disso, uma classe média branca. Desesperadamente tentando se passar por rica, buscando estar nos espaços dos ricos e negando o Brasil solenemente. A ascensão econômica e o desenvolvimento humano e social promovidos nesse país nos últimos anos produziram um espaço (não exatamente público, mas um espaço potencialmente compartilhável por quase todas as camadas sociais, na realidade um conjunto fragmentado de espaços privados vinculados ao capitalismo de serviços) chamado Brasil. Mas, lamentavelmente, não se criou uma nação chamada Brasil. De modo que agora os que sempre foram servidos e os que sempre serviram estão juntos nos mesmos lugares, lugares até então frequentados para fins de obtenção de prestígio unicamente pelos que sempre foram os privilegiados, e onde os que sempre foram marginalizados apenas serviam esses seus senhores. Acontece que esse encontro, que é uma novidade, opera sob uma nova dinâmica social, na qual os de pele mais escura não necessariamente estão servindo os de pele mais clara em troca de um pouco de feijão e farinha. E dessa situação inédita e quase que democrática - que ameaça a crônica desigualdade. Portanto, apavora os que imaginavam que seriam para sempre de uma casta superior. Emerge o rancor, aflora o conflito, escancara-se o racismo, proclama-se todo tipo de estupidez contra negros e pardos, sejam eles brasileiros ou estrangeiros. As indignações, absolutamente vergonhosas, se referem à perda de exclusividades e à ideia absurda, mas de acordo com a mentalidade brasileira que ainda é escravocrata, de que não se pode servir a negros e pardos porque negros e pardos é que devem servir e sempre de forma subalterna, submissa e cordial.